19 de dez. de 2012

Aquela mágica que só se encontra no circo... no Circo Vivant


Trocamos uma ideia massa com a Circo Vivant, a banda responsável por um dos melhores discos nacionais deste ano. Na conversa falamos da sonoridade e das composições do grupo, de questões ligadas à política cultural brasileira, das referências que permeiam o processo criativo do grupo, entre outros assuntos. Vale a pena conferir!

Boa tarde, amigos da Circo Vivant, antes de tudo, obrigado pelo carinho de nos conceder esta entrevista e apresentar o excelente Afroaméricalatinidade aos leitores do blog.

Gramofone Virtual: Contem-nos como começou a Circo Vivant, a reunião do pessoal em torno da ideia de propagar um som tão original e cativante ao mesmo tempo.

Petruchio/Circo Vivant – Rapaz, a banda se juntou com o propósito de fazer um som que estivesse ligado ao improviso, à alegria e principalmente a liberdade de criação. Não temos a algema de nenhum rotulo musical.

Gramofone: Vocês já haviam lançado, em 2009, um EP denominado “Bipolar”. Quais as principais mudanças e evoluções na sonoridade da banda vocês destacam de lá pra cá?

Petruchio/Circo Vivant – A principal delas é a recomposição dos integrantes. Não perdemos a pulsação da estrutura Power trio, mas tentamos colocar mais elementos para tornar a obra mais viva. Além disso, a idéia do afroamericanismo já tinha começado a surgir em novas composições. No Bipolar ainda havia algumas composições dos antigos integrantes. No Afroaméricalatinidade demos mais a cara do formato atual.



Gramofone: Nos últimos anos, é possível notar uma “africanização” da música brasileira, com forte influência de tambores e metais kutianos, e no som de vocês isto pode ser notado desde o título do álbum. Como vocês enxergam este momento da música brasileira?

Petruchio/Circo Vivant – Quando pensamos em registrar em disco nossas “novas” canções já tínhamos notado a nossa natural tendência de por um “balanço” diferente nas canções. Nunca deixamos de ser uma banda de rock, mas notamos que as ruas de jardim atlântico (onde crescemos e vivemos) nos pediam outras verdades. Aquilo nos tornava mais próximo do nosso lugar. Acho que a idéia de africanização da nossa música se confunde com a busca por referências que buscamos na “fonte”. Aqui em PE mesmo, temos maracatu, caboclinho, terreiros de umbanda, etc, convivendo com o calypso, o carimbó, enfim, ritmos que nos deixam próximos da nossa realidade. Talvez os brasileiros estejam se descobrindo cada vez mais africanos. Pode ser um ciclo.


Gramofone: A banda é baseada em Olinda/PE, berço de grandes mestres da música nacional, no entanto, a Circo Vivant tem uma pegada absolutamente única. Em “Bolero de Jardel” mesmo vocês dizem “Não, eu não vou cantar amor, uma outra versão/Daquela mesma canção, que o teu pai te ensinou. Como vocês lidam com as referências locais para a música do grupo e qual leitura podem fazer do atual momento pós-mangue do estado?

Petruchio/Circo Vivant – Temos uma relação de respeito com a geração anterior da música de Olinda. As ladeiras históricas, os casarões coloniais, o Carnaval...tudo isso está no nosso “DNA”, mas não podemos esquecer da nossa verdadeira raiz. A Circo Vivant é mais próxima da praia e do suor da periferia do que dos casarões históricos e das serenatas pelas ladeiras. Sei que em fevereiro tudo vira Carnaval, mas a nossa rotina se deu nos bairros de periferia, perto da praia.



A gente veio das ruas de barro, das peladas nos terrenos baldios, das rodas de amigos nas esquinas. E vindo da li, não temos a propriedade para falar de uma Olinda que não vivemos. Acho que a cena local está mais expansiva nesse sentido. Hoje, temos bandas de todos os lugares da cidade. Não se tem mais intrínseco no estilo musical a cidade de Olinda ou de Recife. Hoje a cena está mais, vamos dizer assim, distribuída. O pernambucano sabe que tem música boa em todo canto.

Gramofone: Vocês já utilizaram alguma lei de incentivo para produzir algum trabalho? O que pensam das dezenas de “coletivos de iniciativa colaborativa” que pipocam em diversos cantos do país, e como vêem a emancipação do estado de Pernambuco perante o Fora do Eixo? Após o fim da Abrafin e a debandada que sofreu o FdE de diversos festivais importantes para a cena independente, há uma mobilização em torno de uma nova associação de festivais independentes no país, vocês acham que o que vem aí pode realmente melhorar o panorama ou não passa de “mais do mesmo”?

Petruchio/Circo Vivant – Não acreditamos nesse processo quase “paternal” que se trata a cena independente. Abraçam algumas bandas, alguns estilos ou tendências, mas no fim tudo fica ainda um tanto “orquestrado”. A movimentação em torno do fora do eixo e da abrafin se tornou algo meio que desnivelado. Bandas são empresas, isso todos temos que perceber. Deve-se haver investimento público nessas empresas, qual será o critério?

Aqui em Pernambuco o critério é a Fundarpe (fundação de patrimônio histórico e artístico de Pernambuco) que escolhe, quanto mais “popular” mais atraente. É uma questão política, não artística. Temos que ter esse discernimento. Na nossa opinião, devemos desenvolver uma cena independente de verdade. Aonde todos sejam pagos por seu trabalho e que o público tenha acesso a espetáculos de qualidade. Para ter qualidade o camarada precisa ser recompensado, por isso esse processo de trocar turnê por exposição é e sempre vai ser a maior furada.



Gramofone: As composições do grupo vão desde cenas cotidianas a referências que permeiam o universo literário latino, com influência de autores como Eduardo Galeano e Carlos Castañeda. Como é o processo criativo da banda?

Petruchio/Circo Vivant – As letras foram sim bastante influenciadas pela literatura. E a nossa rotina é uma forma de reportar para o mundo um lugar que gostamos e lutamos para que não perca a sua honestidade. Acho que é isso que buscamos no processo criativo. Falar do nosso lugar com honestidade. Na questão da composição, na maioria das músicas Pedro Vivant (guitarra), ou Juninho (baixo) apresentavam alguma coisa de harmonia e eu chegava com a letra. O nosso processo é meio assim, mas fizemos música até no quintal de casa. No terraço da casa dos meus pais, por exemplo, fizemos “Moda Pra Zé Pereira”, no meio de uma farra regada a cerveja e tudo mais.  

Gramofone: Vocês já trabalharam com o mestre do groove Buguinha Dub e a produção do Afroaméricalatinidade ficou nas mãos de Sonic Junior, que recentemente lançou um disco bem criticado e recheado de programações com um bass muito bem calibrado. O que estes envolvimentos agregaram ao som da Circo Vivant?

Petruchio/Circo Vivant – Mago, foram duas pessoas importantíssimas na construção da nossa sonoridade atual. Buguinha é mais que um parceiro, é um “mestre” mesmo. Quando ele se encantou por uma música nossa (Um bem – do Bipolar) a gente fez questão de aproximar mais esse olindense do nosso projeto. Já Sonic Jr. foi um daqueles acasos que tornam a vida boa de ser vivida. Encontrei com ele na Feira da Música Brasil, aqui no Recife, e começamos a trocar ideias sobre sons e projetos. Quando vimos, estávamos muito próximos no conteúdo, mesmo ele chegando de SP e a gente aqui em Olinda. E para comprovar que os nossos santos estavam se comunicando, Juninho (Sonic Jr.) montou seu estúdio de gravação à beira mar de bairro novo, ao lado das nossas residências. Já não era mais coincidência, era? Enfim, veio o Afroaméricalatinidade.



Gramofone: Novamente quero lhes agradecer em nome dos leitores do blog, que podem fazer o download do excelente Afroaméricalatinidade logo abaixo da entrevista, e deixo este espaço livre pra palavra de vocês. Obrigado, irmãos!

Petruchio/Circo Vivant – A gente que agradece, em breve esperamos pintar por aí para agitar esse balanço e mostrar a nossa AfroAméricaLatinidade. Baixem o disco e divulguem!!

Saravá.

Abraços,
Carlos Eduardo Petruchio (voz e efeitos)


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